
Expoente do híbrido de pop e MPB que emergiu depois do rock dos anos 80, Marisa é ainda uma influência fundamental para intérpretes da nova geração: todas insistem no flerte com a música cafona, e há até quem imite a sua falta de jeito no palco. Em O que Você Quer Saber de Verdade, porém, até o ecletismo da cantora tornou-se previsível: uma regravação de Jorge Ben aqui, uma balada em seguida, um resgate da MPB tradicional ali. Além disso, os músicos que ela chamou para o disco ou estão descaracterizados (caso do guitarrista Lúcio Maia, do baixista Dengue e do baterista Pupilo, muito aquém do que mostram no grupo Nação Zumbi) ou têm uma participação decorativa. Ao final do CD, tem-se a impressão de ter ouvido não Marisa, mas alguma integrante do batalhão de intérpretes que a imitam. Marisa Monte virou um genérico de si mesma.
Herdeira direta do tropicalismo, movimento pioneiro em dar chancela intelectual à veia kitsch da cultura brasileira, Marisa namora aqui a música ruim da vez, o sertanejo universitário — seja no ritmo, seja nas letras do mais banal romantismo (“você que me faz feliz / você que me faz cantar”). O baladão Depois vem de uma tradição mais sólida, mas igualmente insuportável: lembra como a influência da fase romântica de Roberto Carlos foi nefasta para a MPB. Para um certo público, a voz de Marisa Monte converteu-se em um selo do bom gosto, autorizando a entrada de xotes e boleros na sala de jantar. E é só essa autoridade estabelecida — mas frágil — que ainda permite distinguir suas novas canções daquilo que se ouve em discos de Luan Santana ou Paula Fernandes.
Sérgio Martins