quarta-feira, 21 de junho de 2017

Achados tradicionalmente perdidos!

Lembro-me bem dos meus 9 anos de idade. Na escola de primeiro grau da cidade provinciana onde nasci, um pouco antes do mês dos festejos juninos, uma ebulição preparativa era instaurada no âmbito administrativo, para que nos organizássemos para a festa junina daquele local. A escolha de pares que iam além das salas de aula bem como o turno, a eleição da noiva, do noivo e de toda a comitiva que faria daquele projeto, além de algo muito divertido, uma verdadeira competição que alterava as nossas rotinas. Os ensaios coreográficos que fariam toda a diferença na gincana de quadrilhas, a compra dos metros de tecido (parte dos retalhos acrescidos nas calças, preferivelmente jeans, davam um tom de remendo – que antes de eu começar a participar, achava que estavam rasgadas de fato), chapéus de palha, lenços coloridos para o pescoço e o uso artesanal do lápis delineador para dar o toque caipira da falta de um dente, até as sardas no rosto. Tudo isso configurava nossas fantasias.


Finalmente, na data consagrada ao evento, as fogueiras (que também tinham participação na competição familiar – qual era a mais alta e qual durava mais tempo ao longo da noite), o milho assado na brasa, a canjica, a pamonha, o mungunzá com canela – eu particularmente nunca curti muito essa especiaria, mas tem quem a ame! As apresentações aconteciam sempre nas vésperas (sempre me perguntei por que não no dia?). Outra vez alguém me explicou que depois da meia-noite a gente ainda estava no salão, já era o dia do santo!). O meu dia favorito sempre foi a noite de São João. É certo que Santo Antônio é o padroeiro da minha cidade natal, Solânea/PB, mas sentia algo mais mágico no 23 de junho, não sei se por conta das músicas que faziam referência a este dia ou pelas ilustrações de quadros do chaveiro do céu que eu via nas casas, a caminho do “arraia”.



A música mais apropriada, mais festeira e perfeita para este acontecimento era e sempre será, sem dúvida alguma, a criada pelo mestre e doutor indefectível do xote e do baião, sua majestade Luiz Gonzaga! Todo esse meu saudosismo se deu por conta do questionamento do cancioneiro atual que está a bombardear opiniões nos últimos dias. É fato que muitas das milhares de canções de minha época de festejos juninos jamais me soarão datadas, mas sim inundadas de saudade e de boas lembranças, um poder incrível que a música tem, de nos transportar para a época em que vivenciamos algo, pois é possível até recordar dos cheiros, do clima, enfim.



Recentemente, Elba Ramalho teve seu nome envolvido num debate desarmonioso, onde uma leva da população questiona se uma música de cunho duvidoso e alheio ao bom gosto é parte de uma tradição que sequer não a temos mais em sua completa concepção. É fato que tudo está tendenciando ao moderno, mas certos valores não podem e não devem ser substituídos, porque aí perdemos a nossa identidade, deixamos a nossa história com ares de prosa leviana e, assim, caímos no descarte, naquela tradição do esquecimento. O poder do nosso cancioneiro junino é muito maior que o achismo atual da ignorância humana. Ele se manifesta e acontece sempre independente de nós, fato! E olhando certos comentários concluo que só expandimos o nosso conhecimento de acordo com o quanto estudamos a nossa musicalidade nordestina de raiz. Além disso, afirmo: o que se "acha" não significa nada na fila do pão da melhor padaria da esquina. 



Passar bem, cuidado com as bombas e bom São João!


Segue o link da trilha sonora de toda esse história:

http://www.deezer.com/album/4575341

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